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sábado, 5 de janeiro de 2008

20 anos sem Henfil

O humor que vale para mim é aquele que dá um soco no fígado de quem oprime"
Henfil (em "O Rebelde do Traço - a Vida de Henfil", Dênis de Moraes, José Olímpio Editora, Rio, 1997).

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Então diretor da revista mineira Alterosa, o jornalista Roberto Drummond (autor do best-seller "Hilda Furacão"), mandou chamar aquele revisor que só ficava fazendo desenhinhos no expediente. Eram cartuns meio humor negro, sobre um suicida que pulava do prédio de guarda-chuva para não se molhar.
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- Vou te transformar em cartunista da "Alterosa".

- Mas já no próximo número?

- Sim. Você vai ganhar dez vezes mais. Mas temos que escolher um nome para você assinar os desenhos. Qual é o seu nome todo?

- Henrique de Souza Filho. Eu podia assinar Henriquinho, como todos me chamam.

- Nada disso. Você vai assinar Henfil. Hen de Henrique e Fil de Filho.

Roberto Drummond parecia entender mesmo de furacões. Aquele rapaz se tornaria um dos cartunistas mais cáusticos e brilhantes da sua geração. O traço era agressivo mas ao mesmo tempo transparente, inacabado, uma caligrafia nervosa dotada de incrível poder de expressão, que transmitia plenamente a idéia de movimento e podia representar as expressões mais sutis dos personagens.
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O grosso da carreira de Henfil deu-se dentro do regime militar 1964-1985, e da sua prancheta defendia um engajamento radical e sem concessões contra a ditadura, exceto quando era possuído pelo sádico personagem Baixim e simplesmente fazia uma catarse apolítica e amoral.
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A militância política vem da família. O irmão mais velho Betinho (o sociólogo Herbert de Souza) foi o seu mentor ideológico.
Depois de fazer parte da Juventude Estudantil Católica - JEC (cuja estratégia de aliciação incluía bailinhos organizados pelos irmãos Souza), Betinho foi um dos fundadores da organização marxista Ação Popular (AP), da esquerda católica. Exilado atuante, era ele o "irmão do Henfil" que Elis Regina cantava no hino da abertura "O Bêbado e a Equilibrista" ("Meu Brasil / que sonha / com a volta do irmão do Henfil").
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Também uma irmã e um cunhado pertenciam a organizações de esquerda. O cartunista ainda teve forte atuação nos debates que precederam a anistia, a fundação do PT (o líder petista Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o trabalho de Henfil foi fundamental na sua formação política) e na campanha das Diretas-Já.
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Fez oposição à Tancredo Neves na sucessão presidencial ("Não Senhora! O Maluf não é tão feio quanto se pinta. (...) Quem é este superdemônio? (...) Atenção todas as viaturas! Larguem o Maluf de Tróia! Pau no Colégio Eleitoral! Diretas nele!!!" Henfil, "Diretas Já!", Editora Record, Rio de janeiro, 1984).
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Quando Henfil aterrissou no Pasquim em 1969, em dez semanas tornou-se nome consagrado a ponto de rivalizar com a constelação de estrelas locais: Jaguar, Ziraldo, Millôr, Claudius, Fortuna e Paulo Francis. O incrível sucesso editorial do tablóide (de iniciais 14.000 exemplares chegou a 200.000 no número 27) não foi, infelizmente, acompanhado de sucesso comercial, uma vez que, segundo Jaguar, o dinheiro acabava indo todo para a Escócia - não por culpa de Henfil, que sempre tomava água ou refrigerante por conta dos cuidados com a doença que afligia os irmãos Souza desde o berço.
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Henfil e Betinho nasceram com hemofilia, doença que atingia também o irmão Chico Mário, compositor. Há quem associe a violência do ímpeto criador do chargista à ânsia de viver, sentida por todo hemofílico que corre constantemente perigo de vida. Um pequeno corte ou sangramento na gengiva podem se converter em hemorragias fatais.
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Depois de atravessar a vida driblando aqui e ali a doença hereditária, contraiu o vírus do HIV numa transfusão de sangue, numa época em que a AIDS estava começando a ser compreendida. Henfil morreu em 1988 com apenas 44 anos incompletos.
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Das inúmeras criações de Henfil - torcedores para a imprensa esportiva, operários para a imprensa sindical, paranóicos como Ubaldo e patrulheiros ideológicos como o Cabôco Mamadô, que mandava as personalidades solidárias ao regime ou alienadas para o Cemitério do Mortos-Vivos - os personagens mais elaborados e perenes são, sem dúvida, os Fradinhos e o trio Zeferino, Graúna e Bode.
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"Se não houver frutos, valeu a beleza das flores; se não houver flores, valeu a sombra das folhas; se não houver folhas, valeu a intenção da semente."
Henfil

11 comentários:

Yúdice Andrade disse...

Mais uma postagem antológica. Vai guardando para publicar um livro. Parabéns.

Walter Junior do Carmo disse...

Obrigado, mestre. O Henfil merecia uma homenagem bem maior. Um grande abraço.

Anônimo disse...

Parabens!

Anônimo disse...

parabens...meu lindo amigo!

Walter Junior do Carmo disse...

Lindo é? rsrs Obrigado anonimos. Vou dar uma mexida radical neste blog. Acho que vcs vão gostar.

Anônimo disse...

Querido Junior, Feliz Aniversário e um parabenzão especial para vc. Que Deus te abençoe e ilumine muito. beijão.

Walter Junior do Carmo disse...

Obrigado Lene. Muitas felicidades paz e saude pra vc. E o desfile da Beija Flor, você vai? A colônia macapaense aqui de São Paulo está em polvorosa. Só se fala nisso aqui: cantar Macapá na Sapucaí.

Anônimo disse...

Nooosa! Parabens p quem fez 52 e esta com rosto e corpo de 42... BjBj Gatão - Anonima

Anônimo disse...

uau!!!!arrasando coracoes, meu lindo amigo?!!!

Walter Junior do Carmo disse...

Nem tanto... Nem tanto... rsrs

Anônimo disse...

Grande Henfil, defeito claro que tinha era flamenguista o caboco e azucrinava com nosso botafogo de resto um grande assim como o grande Garrincha que se foi há 30 anos e o Brasil se esqueceu de seu maior Jeca Tatu
Abs Tadeu